Do Inferno da Guerra Síria ao Recomeço no Rio: A Jornada de Abdullah Alharoun

Roberto Farias
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Abdullah Alharoun, um farmacêutico de 30 anos nascido em Aleppo, na Síria, carrega as cicatrizes de uma guerra civil que devastou seu país. Em entrevista ao G1, ele revelou os horrores que enfrentou antes de encontrar refúgio no Brasil, há três semanas, acolhido por uma família carioca que conheceu online. Sua história é marcada por sequestros, torturas e perdas, mas também por esperança e resiliência.
Quando a revolução síria eclodiu em 2011, Abdullah, então estudante universitário, usava redes sociais para criticar o regime de Bashar al-Assad. Sua ousadia custou caro: foi capturado por agentes da inteligência governamental, que o torturaram por três dias. “Estávamos apenas exigindo nossos direitos”, lembra. Após ser libertado, enfrentou outro pesadelo: um grupo opositor, que ele suspeita ser ligado à Al-Qaeda ou a desertores militares, o sequestrou, exigindo US$ 20 mil de resgate. Vendado e sem saber onde estava, Abdullah só foi solto após sua família reunir a quantia. “Era contra meus princípios ceder, mas não tive escolha”, conta.
A guerra não poupou suas conquistas. Sua casa e farmácia em Aleppo foram destruídas por bombardeios, enquanto o governo controlava o espaço aéreo e grupos radicais dominavam o território. Sem opções na Síria, Abdullah buscou refúgio na Europa, mas países como a Grécia negaram seu visto. Na Turquia, onde se abrigou temporariamente com amigos virtuais, tentou a sorte com o Brasil. Inicialmente, planejava ir a São Paulo, atraído pela comunidade árabe, mas uma família de Rocha Miranda, no Rio de Janeiro, mudou seu destino.
Conhecida pela internet, a família de Patrícia e Jonatan, de 18 anos, abriu as portas de sua casa no subúrbio carioca. “Ganhei um irmão novo”, diz Abdullah, sorrindo, sobre Jonatan. No aeroporto, foi recebido com carinho e, desde então, vive com eles. “Eles têm sido incríveis desde o primeiro dia”, afirma. No Brasil, ele foi encaminhado pela Polícia Federal à Cáritas Arquidiocesana do Rio, onde estuda português e aguarda uma entrevista, marcada para 24 de setembro, para formalizar seu pedido de refúgio.
Enquanto seus familiares permanecem na Turquia, Abdullah sonha com uma vida simples no Brasil. “Quero uma rotina, um apartamento, talvez dividir com alguém. Sonho com a cidadania brasileira, encontrar uma esposa e casar aqui”, revela, com um sorriso tímido. Ele descarta trazer sua mãe, já idosa, que vive bem com uma família síria na Turquia e dificilmente se adaptaria a uma nova cultura.
A Síria, mergulhada em conflito desde 2011, já perdeu mais de 110 mil vidas e expulsou 2 milhões de refugiados, segundo a ONU. No Brasil, 255 sírios buscam abrigo, 242 deles após o início da guerra. Abdullah é um deles, tentando transformar o trauma em um novo começo. Sua história reflete a dor de um povo e a força de quem encontra, em terras distantes, uma chance de reescrever o futuro.

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